Aros

““O colégio do meu tempo. O casarão enorme – antigo convento – com a igreja ao lado. As paredes imensas, de cal e pedra, são verdadeiras fortalezas, resistindo ao sol e à chuva. Têm uma cor embaciada, mistura de branco, cinza e negro. Em algumas delas estão cavados imensos corredores que nunca se sabe para onde vão, pois tem-se medo de atravessá-los. Há corujas e morcegos habitando aqueles buracos negros.

Há um cheiro de passado nos corredores escuros, nas escadas empoeiradas, envernizadas pelo tempo, nas salas úmidas. As pedras sepulcrais se espalham pelos pátios, pelos quintais, dentro da própria igreja. Os túmulos atrás do Altar-mor pertencem a capitães, generais, comandantes. Aquele altar, esculpido em prata e ouro é sóbrio, mas de uma beleza estonteante. As colunas majestosas, brancas, agrupadas uma perto da outra como em feixes, parecem uma floresta. Pelos altares laterais, os santos antigos têm cabelos de verdade e vestidos de cetim roxo. Ao lado está a capela da Ordem Terceira, com a Via Crucis de Cristos sangrantes, de caras sofredoras e trágicas. No adro, as marcas de sangue são recordações da Guerra da Cabanagem. O silêncio é o frescor da nave. A igreja, como parte principal do todo, como ponto primordial dos sentimentos e das ações.

As árvores dos pátios – as sombras. As varandas de madeira entre o verde e os arcos. No fim do grande pátio escuro está o nincho da Virgem, iluminado em azul. O reflexo da luz chega ao rosto da imagem tornando-o grotesco e sisudo. À noite, o vento corre sobre a folhagem, varrendo os quintais. Aparecem outras sombras no rosto da Virgem. Ela parece mexer os músculos da face num sorriso trágico e impossível.””

In: Estórias paralelas, 1999, 140 páginas

Valdir Sarubbi (Bragança, Pará, 10 de outubro de 1939 – São Paulo, 8 de novembro de 2000)

Autor: ematosinho

Eduardo Matosinho é economista e sociólogo com bacharelado pela Universidade de São Paulo (USP). Tem 60 anos e é casado com Luiza Maria da Silva Matosinho e com ela tem um filho de nome João Alexandre da Silva Matosinho. Trabalha atualmente na Galeria Pontes (https://www.galeriapontes.com.br/), onde já está há 17 anos.

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