Uma flor de verde pinho

Eu podia chamar-te pátria minha
dar-te o mais lindo nome português
podia dar-te um nome de rainha
que este amor é de Pedro por Inês.

Mas não há forma não há verso não há leito
para este fogo amor para este rio.
Como dizer um coração fora do peito?
Meu amor transbordou. E eu sem navio.

Gostar de ti é um poema que não digo
que não há taça amor para este vinho
não há guitarra nem cantar de amigo
não há flor não há flor de verde pinho.

Não há barco nem trigo não há trevo
não há palavras para dizer esta canção.
Gostar de ti é um poema que não escrevo.
Que há um rio sem leito. E eu sem coração.

Manuel Alegre (Águeda, Portugal, 12 de maio de 1936)

A magnólia

A exaltação do mínimo,
e o magnífico relâmpago
do acontecimento mestre
restituem-me a forma
o meu resplendor.

Um diminuto berço me recolhe
onde a palavra se elide
na matéria – na metáfora –
necessária, e leve, a cada um
onde se ecoa e resvala.

A magnólia,
o som que se desenvolve nela
quando pronunciada,
é um exaltado aroma
perdido na tempestade,

um mínimo ente magnífico
desfolhando relâmpagos
sobre mim.

Luiza Neto Jorge (Lisboa, Portugal, 10 de maio de 1939 — Lisboa, Portugal, 23 de fevereiro de 1989)

À luz da Lua!

Iamos sós pela floresta amiga,
Onde em perfumes o luar se evola,
Olhando os céus, modesta rapariga!
Como as crianças ao sair da escola.

Em teus olhos dormentes de fadiga,
Meio cerrados como o olhar da rola,
Eu ia lendo essa ballada antiga
D’uns noivos mortos ao cingir da estola…

A Lua-a-Branca, que é tua avozinha,
Cobria com os seus os teus cabellos
E dava-te um aspeto de velhinha!

Que linda eras, o luar que o diga!
E eu compondo estes versos, tu a lel-os,
E ambos scismando na floresta amiga…

António Nobre (Porto, Portugal, 16 de agosto de 1867 — Foz do Douro, Portugal, 18 de março de 1900). In “Só”

Tiradentes: Patrono cívico do Brasil

Desenho feito por mim em 1978 como trabalho escolar enquanto cursava a 7ª. série do primeiro grau do ensino fundamental no EEPG Dalton Morato Villas Bôas, Vila Odilon, Ourinhos – SP.

Joaquim José da Silva Xavier, conhecido como Tiradentes (Fazenda do Pombal, Minas Gerais, batizado em 12 de novembro de 1746 — Rio de Janeiro, 21 de abril de 1792)

No fundo azul

No fundo azul
no espelho de uma delicada tristeza
que os meus olhos reflectem:
vês-me?
vês-me como eu sou?
vês-me como algo que se descobre
na acrobacia da imagem?

Na sensual tranquilidade da palavra
o poeta tenta uma arriscada ordem
e entre a fábula e a reportagem

simula mentir
para atingir
a superior verdade

Ana Hatherly (Porto, Portugal, 15 de Junho de 1929 – Lisboa, Portugal, 5 de Agosto de 2015). In “A idade da escrita”