Poemas e outros bichos no Espaço Cultural Cita

Que delícia vai ser colocar os bichos para fora naquele espaço!
Acessível a todes, todas e todos!
Venham!
@espaco_cita
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Cintia Alves – Dramaturga, roteirista, diretora teatral e pesquisadora de acessibilidade estética. Gestora do @vozesdiversas.

Espetáculo visual musical “Poemas e outros bichos” voltou!!!
Venha cantar, dançar, sinalizar e se divertir com a Lagarta, a Graciela, a Marreca Manuela, a Tartaruga surda e todes es biches do Transatlântico Noé!

Dia: 03/06 (sexta-feira)
Horário: 20h
Gratuito – Lotação: 30 lugares
Local: @espaco_cita (próximo ao terminal de ônibus do Campo Limpo) – Rua Aroldo de Azevedo, 20 – Jardim Bom Refúgio/ Campo Limpo – São Paulo – SP.

Comentário da diretora (#descriçãodaimagem E-flyer espetáculo teatral): “O espetáculo teatral “Poemas e outros bichos” sobre um quadrado de fundo azul escuro com aspecto de papel amassado e canto superior esquerdo com detalhe branco. Nos cantos superiores e inferior esquerdo, há 3 ilustrações de “bichos” feitos de materiais recicláveis. Logo abaixo, em letras brancas o escrito: “Espaço Cultural Apresenta”. Título do espetáculo apresentado com diversas fontes como recortes de revistas. Logo abaixo escrito em preto em um quadro branco: “com Grão Arte e Cidadania”. Abaixo, em amarelo e letras garrafais, a data 03 de Junho e o horário às 20h. No canto inferior esquerdo, um pequeno quadro preto informando a acessibilidade em libras e abaixo, em letras brancas: Ingressos limitados, reservas pelo e-mail programacao.cita@gmail.com. Na parte inferior ao centro as logomarcas do Espaço Cita, PROAC, de São Paulo, da Secretária especial da Cultura, do Ministério do Turismo e do Brasil“.

Leia mais: www.vozesdiversas.com

A galinha reivindicativa ou The hen’s liberation

Em certo dia de data incerta, um galo velho e uma galinha nova encontraram-se no fundo de um quintal e, entre bicada e outra, trocaram impressões sobre como o mundo estava mudado. O galo, porém, fez questão de frisar que sempre vivera bem, tivera muitas galinhas em sua vida sentimental e agora, velho e cansado, esperava calmamente o fim de seus dias.

_ Ainda bem que você está satisfeito – disse a galinha – E tem razão de estar, pois é galo. Mas eu galinha, posso estar satisfeita? Não posso. Todo dia pôr ovos, todo semestre chocar ovos, criar pintos, isso é vida? Mas agora a coisa vai mudar. Pode estar certo de que vou levar uma vida de galo, livre e feliz. Há já seis meses que não choco e há uma semana que não ponho ovo. A patroa se quiser que arranje outra para esses ofícios. Comigo não, violão!

O velho galo ia ponderar filosoficamente que galo é galo e galinha é galinha e que cada ser tem sua função específica na vida, quando a cozinheira, sorrateiramente, passou a mão no pescoço da doidivanas e saiu com ela esperneando, dizendo bem alto: _ “A patroa tem razão: galinha que não choca nem põe ovo só serve mesmo é pra panela”!

Moral: Um trabalho por jornada mantém a faca afastada.

Millôr Fernandes (Rio de Janeiro, 16 de agosto de 1923 — Rio de Janeiro, 27 de março de 2012), In “Fábulas Fabulosas” (Ilustração do autor), Círculo do livro por cortesia da Editora Nórdica Ltda., Rio de Janeiro, 1973

Memórias do Cárcere – Volume II (Trecho)

Gaúcho começou a procurar-me. A noite acocorava-se junto à minha esteira, ficava até a hora do silêncio a entreter-me com a narração das suas complicadas aventuras. Esforçava-me por entendê-lo, às vezes o interrompia buscando compreender alguma expressão de gíria. Vanderlino trocava-me em linguagem comum a prosa obscura, e na ausência dele a conversa arrastava-se, cheia de equívocos e repetições.

– Os homens, dizia Gaúcho, dividem-se em duas classes: malandros e otários, e os malandros nasceram para engrupir os otários.

Ria-me com a franqueza do meu esquisito amigo:

– Eu, naturalmente, devo figurar na categoria dos otários, não é verdade?

– Se vossa mercê não é malandro… Só há duas classes.

Logo no segundo ou terceiro encontro o arrombador me fez esta observação curiosa:

– Vossa mercê usa panos mornos comigo, parece que tem receio de me ofender. Não precisa ter receio, não; diga tudo: eu sou ladrão.

– Sim, sim, retruquei vexado. Mas isso muda.

Lá fora você pode achar ofício menos perigoso.

– Não senhor, nunca tive intenção de arranjar outro ofício, que não sei nada. Só sei roubar, muito mal: sou um ladrão porco.

Diversos profissionais corroboravam esse juízo severo, ostentavam desprezo à modesta criatura. Eram em geral vaidosos em excesso, fingiam possuir qualidades extraordinárias e técnica superior. Tentavam enganar-nos, talvez enganar-se, mentiam, queriam dar a impressão de realizar trabalho perfeito. Não se misturavam com os indivíduos comuns, e o natural expansivo do escrunchante exasperava-os. Obtive lápis, papel, comecei de novo a tomar notas, embora fosse quase certo jogá-las fora.

(…)

Graciliano Ramos (Quebrangulo, Alagoas, 27 de outubro de 1892 – Rio de Janeiro, 20 de março de 1953), In “Memórias do Cárcere – Volume II, Capítulo 17, Literatura comentada, Nova Cultural, 1988.

Os teólogos (Trecho)

Arrasado o jardim, profanados os cálices e os altares, entraram a cavalo os hunos na biblioteca monástica e rasgaram os livros incompreensíveis e os injuriaram e queimaram, talvez temerosos de que as letras encobrissem blasfêmias contra seu deus, que era uma cimitarra de ferro. Arderam palimpsestos e códices, mas no coração da fogueira, entre as cinzas, permaneceu quase intato o livro duodécimo da Civitas Dei, que narra que Platão ensinou em Atenas e, no fim dos séculos, todas as coisas recuperarão seu estado anterior, e que ele, em Atenas, diante do mesmo auditório, de novo ensinará essa doutrina. O texto que as chamas perdoaram desfrutou de veneração especial e os que o leram e releram nessa remota província esqueceram que o autor só declarou tal doutrina para poder melhor refutá-la. Um século depois, Aureliano, coadjutor de Aquiléia, soube que às margens do Danúbio a novíssima seita dos monótonos (chamados também anulares) professava que a história é um círculo e que nada é que não tenha sido e que não será. Nas montanhas, a Roda e a Serpente tinham deslocado a Cruz. Todos temiam, mas todos se confortavam com o boato de que João de Panonia, que se distinguira com um tratado sobre o sétimo atributo de Deus, ia impugnar tão abominável heresia.

Aureliano deplorou essas notícias, sobretudo a última. Sabia que em matéria teológica não há novidade sem perigo; depois refletiu que a tese de um tempo circular era demasiado dissímil, demasiado assombrosa para que o perigo fosse grave. (As heresias que devemos temer são as que podem confundir-se com a ortodoxia.) Mais lhe doeu a intervenção – a intrusão – de João de Panonia. Havia dois anos, ele usurpara com seu palavroso De Septima Affectione Dei Sive de Aeternitate um assunto da especialidade de
Aureliano; agora, como se o problema do tempo lhe pertencesse, ia retificar, talvez com argumentos de Procusto, com triagas mais temíveis que a Serpente, os anulares… Nessa noite, Aureliano folheou o antigo diálogo de Plutarco sobre a cessação dos oráculos; no parágrafo vinte e nove, leu uma burla contra os estóicos que defendem um infinito ciclo de mundos, com infinitos sóis, luas, Apolos, Dianas e Poseidons. O achado pareceu-lhe prognóstico favorável; resolveu adiantar-se a João de Panonia e refutar os heréticos da Roda.

(…)

Jorge Luis Borges (Buenos Aires, 24 de agosto de 1899 — Genebra, Suíça, 14 de junho de 1986), In “O Aleph”, tradução de Flávio José Cardoso, Editora Globo, Porto Alegre, 1972

Waldecy de Deus: Exposição no Metrô Consolação

Waldecy de Deus é uma pessoa de notória evidência no Naïf Brasileiro pela seriedade dada as suas pinturas, em detrimento às mensagens pueris, folclóricas e amenas, que as mesmas exprimem. São pinturas que magicamente deslizam pela paleta das cores, deixando impresso nas telas, o dia a dia das pessoas, seja no labor ou no lazer, de forma poética e singular, o que a torna membro legítimo do mundo Naïf. Waldecy pinta com emoção, respondendo à uma inquietude interior, personagens, paisagens e cenas, de forma intensa, sensível e detalhista, o que a consolida em um mundo onde a necessidade poética da arte se faz necessária frente a dureza de sua realidade.

Waldecy de Deus Fuhrman nasceu em Boa Nova, Bahia, em 1952. Transferiu-se para São Paulo em 1970, onde começou a pintar. Em 2020 completou 50 anos de carreira e com mais de 4 mil quadros pintados, já teve obras expostas na Alemanha, Suíça, França, Itália, Japão e Estados Unidos. Participou de diversas exposições individuais no Sesc, Santos, SP (1970); Grande Hotel da Barra, Salvador, BA (1971); Sesc, São Paulo, SP (1972/1979); Galeria KLM, SP (1974); Galeria Nuclearte, Osasco, SP (1975); Galeria Arumã, Ribeirão Preto, SP; Pintura Primitiva, Jabuticabal, SP (1976); Museu Dimitri Sensaud Lavaud, Osasco, SP (1978/1988); Via Cores, Sesi, São Paulo, SP (2003). Esteve presente ainda em inúmeras mostras coletivas, como Festival da Batida USIS, São Paulo (1969); Frankfurt, Alemanha; Instituto Brasileiro Americano, Washington, EUA; Universidade de Indiana, EUA (1971); 21º Pittori Naïfs Brasiliani, Itália; Birmingham Museum Art, Alabama, EUA (1973); 5º Naïfs no Paço Municipal, São Bernardo do Campo, SP (1979); Arte Negra e Raízes, Paço das Artes, São Paulo, SP (1981); Mito e Magia dei Colori, Napoles, Itália (1982); Centro de Arte Primitiva, SP (1992); O Místico na Arte Popular Brasileira, São Paulo, SP (1993); Bienal Brasileira da Arte Sesc, Piracicaba, SP (1994), Naïfs do Brasil, Sesc, Piracicaba, SP (1998), Suas obras estão incluídas no Dicionário de Artes Plásticas, MEC (1979); Artes Plásticas Brasil, 1989 e 1990, Editora Júlio Louzada (1989, 1990); Bienal Brasileira de Arte Naïf Sesc, Piracicaba, São Paulo (1994) entre outros.

Texto: Hélio Costa

Hélio Costa é documentarista, produtor cultural, multimídia e criador de diversas logomarcas e capas de livros. Hoje um dos maiores divulgadores da arte paraibana e um dos youtubers mais respeitado no meio artístico, e, dono de um imenso acervo fotográfico de artes plásticas da Paraíba. Membro da Academia Cabedelense de Letras – Paraibana.

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