Destaque

Exposição “Entre rastros” – Zé Bezerra

“Abertura 09/04
Venham!!”

Jairo e Maíra da Fibra Galeria convidam…

Zé Bezerra (Buíque – PE, 1952) – o fotógrafo e jornalista Eduardo Issa nos faz uma descrição emocionada do artista: “Voltando dos Breus a caminho do povoado do Catimbau, uma figura pitoresca e carismática fez do quintal da sua casa um espaço artístico para expor suas obras. Zé Bezerra, 73 anos, “cabra da roça” e pequeno agricultor com rosto vincado pelo tempo, a partir de 2002 virou artesão e passou a transformar árvores caídas, pedaços de troncos e raízes em pura arte. Suas obras retratam as mais diversas figuras, desde cabeças de gente, carros de boi, animais, enfim tudo que faz parte do universo sertanejo. Para Zé Bezerra, a forma e o destino de suas obras são decididos na hora, quando põe nas mãos aquele pedaço de madeira, vem na sua mente o que deve ser feito. O resultado é fabuloso, as peças parecem querer dizer alguma coisa aos visitantes”.

Jairo B. Goldenberg
Rua Tinhorão , 69 – Higienópolis, São Paulo, Brazil 01241-030
jbgoldenberg.com.br
www.instagram.com/jbgoldenberg

Maíra Maciel
Casa de leilões
Leiloeira oficial apenas para os leilões de Arte da @fibraleiloes.
www.fibragaleria.com
www.instagram.com/mairamaciel

“Nesta quarta-feira, 9 de abril, será inaugurada “Entre Rastros – Zé Bezerra”, em São Paulo, uma exposição dedicada à obra do escultor pernambucano. Tenho o prazer de assinar o texto da mostra (deixo um trechinho a seguir) e é com muita alegria que convido a todos para este momento especial!

[…] Entre Rastros celebra a obra de Zé Bezerra e tateia os contornos do seu processo criativo. As tortuosidades dos percursos por onde transita o pensamento artístico podem ser transmutadas na ânsia que só sossega com a sova na madeira, no recuo das hesitações e na aparição dos seres que ali sempre habitaram. A conversa de Zé Bezerra com as obras é, para além de uma ação corriqueira, apenas o desempate da consciência: as esculturas passam a existir também para fora do artista. É desdoidar. Só o clarão do olhar é capaz de desvelar o caminho a ser trilhado, só a liberdade caminha entre rastros.””

Renan Quevedo – Pesquisador, curador e palestrante. De “Novos Para Nós” (www.instagram.com/novosparanos) – Pesquisa, mapeamento e divulgação de artistas populares.

Serviço: Entre rastros – Zé Bezerra. Fibra Galeria: Rua Tinhorão, 69 – Higienópolis, São Paulo–SP. Abertura 9/4/25, das 19h às 22h. Até 19/4/25. Curadoria Sarah Cunha e Pedro Paulo Mendes. Grátis.

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Meio-dia

Ao meio-dia a vida
é impossível.
A luz destrói os segredos:
a luz é crua contra os olhos
ácida para o espírito.
A luz é demais para os homens.
(Porém como o saberias
quando vieste à luz
de ti mesmo?)
Meio-dia! Meio-dia!
A vida é lúcida e impossível.

Orides Fontela (São João da Boa Vista, São Paulo, 1940 — Campos do Jordão, São Paulo, 1998). Postado recentemente pela amiga Celi Audi em seu perfil do Facebook

Primeiro poema de outono

Mais uma vez é preciso
reaprender o outono –
todos nós regressamos ao teu
inesgotável rosto
Emergem do asfalto aquelas
inacreditáveis crianças
e tudo incorrigivelmente principia
Já na rua se não cruzam
olhos como armas
Recebe-nos de novo o coração
E sabe deus a minha humana mão

Ruy Belo (São João da Ribeira, Rio Maior, Portugal, 27 de fevereiro de 1933 — Queluz, Sintra, Portugal, 8 de agosto de 1978). In “Todos os poemas I”. Cidade. Assírio & Alvim, 2004

Nova luz

Emana um fumo d’alma o crepitar do lume…
O incêndio duma flor dá a cinza do perfume.
E o corpo duma onda é um místico braseiro
Que exala, numa ânsia, o branco nevoeiro…
É o incêndio supremo e santo da Matéria,
Donde sai uma luz anímica e sidérea…
Tudo o que é material, como a rocha erma e calma.
Querendo e desejando, é luz, é sonho, é alma!
A alma é o exterior, o corpo o interior.
Onde termina um coração, começa o amor…
Por isso, cada corpo inânime e pesado
Duma auréola d’infinda luz está banhado.
E, assim, uma ansiedade ignota, uma quimera.
Pôs em volta da terra a lúcida atmosfera!…
A luz envolve a chama e a chama envolve a lenha…
Sensível musgo cobre uma insensível penha,
E sobre o musgo paira o aroma espiritual…
Mistério… Num aroma a pedra é imaterial!
E todavia são a mesma vida pura
O claro aroma, o verde musgo, a penha dura!…
A terra é a mãe da Alma, a terra deu à luz
O perfume da flor e a alma de Jesus!…
O lodo é a Piedade, é o Amor infinito.
É apenas comoção a rocha de granito…
No Poeta comovido há a loucura do vento;
A nuvem é um delírio, a água um sentimento…
A fonte que através dum areal se perde,
As suas margens vai vestindo de cor verde,
Lançando nessa terra estéril, ressequida,
Num beijo sempiterno, a semente da Vida.
Uma gota d’orvallio é sonho, é ansiedade,
Quer desça sobre o pó, quer suba à claridade…
Qualquer terra que a toque acorda deslumbrada,
E é uma erva, um perfume, uma alma enamorada!
E é gota d’água, ó astro espiritual, bendito,
Ampliada pela luz, abranges o infinito…
És o éter transcendente, o grande transmissor
Da voz dos mundos e do seu estranho amor!…

Todos os robles dão, ardendo, a mesma luz…
Um tronco sobre um lar é um Cristo numa cruz!
E é calor que agasalha e facho que alumia
O que é em Cristo amor, piedade, harmonia…
E tudo o que é no poeta emoção e delírio
É luz no sol, canto nas aves, cor no lírio!…
E tudo o que é em nós Bondade é num rochedo
Viçoso musgo e santa sombra no arvoredo!…
E, enquanto dou a um pobre um bocado de pão,
O sol enche de luz o saco da amplidão!
E, qual Samaritana, a nuvem religiosa
Dá de beber a toda a terra sequiosa…
Um murmúrio de fonte é um Sermão da Montanha
E a neblina da tarde uma ascensão estranha!…
E enquanto eu sou a morte, ó velho e frio inverno,
Perante o sol — Jesus, és um Lázaro eterno.
Um promontório é um Cristo altivo, triste e só,
E o mar divino um poço imenso de Jacob!…
E as verdes ervas são versículos sagrados
Que os ribeiros e o sol escrevem sobre os prados…
E uma pedra contém a história verdadeira
Do Génesis, da Luz e da Mulher primeira!…
Ainda hoje, o Dilúvio, o velho avô das fontes,
Anda na boca das florestas e dos montes!…
E a mais estéril terra ainda recorda e chora
O tempo em que beijou teus lábios d’oiro, aurora,
Pela primeira vez, ardente de paixão!
Ainda hoje impressiona a terra a sensação
Que seu corpo diluiu em mística ternura,
Ao conceber a primitiva criatura!
E nos olhos da terra ainda fulgura a imagem
De tudo o que ela viu, nessa grande viagem
Através da penumbra infinda do Mistério,
Até desabrochar num coração etéreo!
Há nos olhos da terra a imagem desse olhar
Que a saudade transforma, às vezes, em luar…

Deus disse à luz do sol o segredo da Vida.
Desvendemos a Luz amada e preferida!…
Vejamos a razão suprema da existência
E o que ela tem d’ amor, de espírito e de essência,
O que nela é real, eterno e inconfundível…
Que o nosso olhar penetre o mundo do invisível.
Os paramos do Sonho, a amplidão da Quimera,
Onde já se descobre etérea Primavera,
Nebulosa subtil composta dum perfume.
Dum éter, dum amor, duma luz que resume
A nova Criação que está para surgir
Do caos de Amanhã, do beijo do Porvir!…

O pó que a gente vê sobre os campos, disperso,
É um caos; nele sonha um místico Universo!
Apaga-se uma estrela e nela ressuscita
A sua frágil luz, numa luz infinita…
Se um homem fecha os roxos olhos, congelado,
D ‘olhos eternos ele fica constelado!
B duns ouvidos transformados em poeira,
Brota a audição completa, imensa e verdadeira…
B tudo o que termina e a cinza se reduz,
Vai acordar em alma e despertar em luz!
Um mundo auroreal, quimérico germina
Em cada areia, em cada gota cristalina…
E a nova Vida, numa onda a resplender,
Aflora à superfície ideal do novo ser.
Um novo Apolo vai tocar a nova Lira…
E na água que se bebe e no ar que se respira,
Nas nuvens onde dorme a clara luz dos céus,
Palpita um novo amor, murmura um novo Deus…

Teixeira de Pascoaes, pseudônimo literário de Joaquim Pereira Teixeira de Vasconcelos (São Gonçalo, Amarante, Portugal, 8 de novembro de 1877 — Amarante, Gatão, Portugal, 14 de dezembro de 1952). In “Para a luz”

Branco e vermelho

A dor, forte e imprevista,
Ferindo-me, imprevista,
De branca e de imprevista
Foi um deslumbramento,
Que me endoidou a vista,
Fez-me perder a vista,
Fez-me fugir a vista,
Num doce esvaimento.
Como um deserto imenso,
Branco deserto imenso,
Resplandecente e imenso,
Fez-se em redor de mim.

Todo o meu ser, suspenso,
Não sinto já, não penso,
Pairo na luz, suspenso…
Que delícia sem fim!
Na inundação da luz
Banhando os céus a flux,
No êxtase da luz,
Vejo passar, desfila
(Seus pobres corpos nus
Que a distancia reduz,
Amesquinha e reduz
No fundo da pupila)
Na areia imensa e plana
Ao longe a caravana
Sem fim, a caravana
Na linha do horizonte
Da enorme dor humana,
Da insigne dor humana…
A inútil dor humana!
Marcha, curvada a fronte.
Até o chão, curvados,
Exaustos e curvados,
Vão um a um, curvados,
Escravos condenados,
No poente recortados,
Em negro recortados,
Magros, mesquinhos, vis.
A cada golpe tremem
Os que de medo tremem,
E as pálpebras me tremem
Quando o açoite vibra.
Estala! e apenas gemem,
Palidamente gemem,

A cada golpe gemem,
Que os desequilibra.
Sob o açoite caem,
A cada golpe caem,
Erguem-se logo. Caem,
Soergue-os o terror…
Até que enfim desmaiem,
Por uma vez desmaiem!
Ei-los que enfim se esvaem,
Vencida, enfim, a dor…
E ali fiquem serenos,
De costas e serenos.
Beije-os a luz, serenos,
Nas amplas frontes calmas.
Ó céus claros e amenos,
Doces jardins amenos,
Onde se sofre menos,
Onde dormem as almas!
A dor, deserto imenso,
Branco deserto imenso,
Resplandecente e imenso,
Foi um deslumbramento.
Todo o meu ser suspenso,
Não sinto já, não penso,
Pairo na luz, suspenso
Num doce esvaimento.
Ó morte, vem depressa,
Acorda, vem depressa,
Acode-me depressa,
Vem-me enxugar o suor,
Que o estertor começa.
É cumprir a promessa.
Já o sonho começa…
Tudo vermelho em flor…

Camilo Pessanha (Coimbra, Portugal, 7 de setembro de 1867 – Macau, território de Portugal até 1999 e atualmente região autônoma da China, 1 de março de 1926). In ‘Clepsidra’