Crônica de Fernando Pacheco Jordão: Marianinha

A menina, a florzinha, a partida.
Crônica dedicada a minha mãe, Marianinha, falecida em abril de 2010 – uma morte felizmente sem sofrimento, uma partida muito tranqüila. Tenho em meu quarto uma encantadora fotografia de minha mãe quando criança. Uns cinco ou seis anos, moreninha, rostinho redondo, descalça, com um enorme regador a molhar uma florzinha num vaso no quintal. A foto é preto e branco, mas, pelas diferenças de tons, pode-se adivinhar que seu vestidinho era azul marinho ou verde escuro; e o regador, vermelho.
Passado mais de um século, nada do que está nessa foto existe mais.
O vestidinho, se bem me lembro de minha avó e dos costumes da cidade do interior onde moravam, ela deu para alguma criança pobre cuja mãe passava de porta em porta recolhendo roupas usadas para seus filhos. Com certeza levou também, de presente, o regador.
Quanto a minha mãe, aos 102 anos, felizmente sem nenhuma doença – só mesmo a idade, na cama, em sua própria casa, longe de hospital, aparelhos, tubos, baterias de medicamentos, como a chama tênue de uma vela exposta ao vento, ela foi pouco a pouco se extinguindo, até apagar de vez; como a florzinha que regava no quintal, ela foi fenecendo naturalmente e, quando chegou a sua hora, ela simplesmente se foi. Ela partiu desta vida quietamente.
Em paz.

Fernando Pacheco Jordão (1937 – 2017) faleceu em São Paulo aos 80 anos. Atuou no jornalismo desde 1957, quando iniciou sua carreira na antiga Rádio Nacional, em São Paulo. Posteriormente, trabalhou como repórter, redator e editor de diversos veículos, como O Estado de S. Paulo, TV Excelsior, BBC de Londres, TV Globo, TV Cultura de São Paulo, revistas IstoÉ e Veja. Como consultor e assessor político atuou nas campanhas dos governadores Mário Covas e Geraldo Alckmin. Dirigente do Sindicato dos Jornalistas de São Paulo na época do assassinato de Vladimir Herzog, Fernando escreveu o livro “Dossiê Herzog – Prisão, Tortura e Morte no Brasil”, que já está na sétima edição revista e ampliada e constitui documento fundamental para a História do Brasil. Foi sócio-diretor da FPJ – Fato, Pesquisa e Jornalismo. Hoje é patrono do “Prêmio Jovem Jornalista Fernando Pacheco Jordão”, realizado pelo Instituto Vladimir Herzog desde 2009 e que já está em sua 13ª edição.

Autor: ematosinho

Eduardo Matosinho é economista e sociólogo com bacharelado pela Universidade de São Paulo (USP). Tem 60 anos e é casado com Luiza Maria da Silva Matosinho e com ela tem um filho de nome João Alexandre da Silva Matosinho. Trabalha atualmente na Galeria Pontes (https://www.galeriapontes.com.br/), onde já está há 17 anos.

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *