De “Estórias Paralelas” – Valdir Sarubbi

Selecionei um trecho de um conto chamado “Os Dias vazios”, escrito pelo artista paraense Valdir Sarubbi, que foi meu saudoso professor de pintura. Ele era um leitor muito dedicado e um profundo conhecedor de literatura. Na última fase de sua vida ele se empenhou em escrever memórias e contos. Neste trecho o personagem fala sobre sua amizade com o amigo poeta e de como ele era.

“Falava de minha vontade de ir morar em Belém e fugir daquela vida monótona à beira do rio Caeté. Mas o que eu queria fazer? No fundo, não imaginava. Eu era um insatisfeito que sabia fingir muito bem que estava satisfeito com tudo. Quem me visse sorrindo nas rodas de amigos ou nas reuniões de família mal podia imaginar o que me passava pela alma. E que eu não podia nem falar para meu melhor amigo, o poeta que se sentava comigo na Praça da Intendência.

Quando ele declamava naquelas noites de lua, ficava olhando seu rosto levemente iluminado pelo luar. Era um rosto expressivo mostrando a emoção que suas palavras transpareciam. Seus poemas falavam de amor, de saudade, da beleza da vida entremeada com a tristeza da morte. O poeta falava da vida, mas também vivia tão pouco quanto eu.

As moças gostavam de ouvir seus sonetos. Faziam roda e ele declamava cheio de ardor. Havia sempre uma ou outra lágrima nos olhos de alguma delas. E quando percebia, matizava os versos com sua linda voz. Era aplaudido. Mas nesses momentos era como se algo acontecesse com ele. Ficava calado, punha as mãos nos bolsos e lançava olhares desesperados em volta. E se alguma das moças se aproximava para conversar, saia de mansinho, se afastando para longe dali.”

Estórias paralelas, 1999, 140 páginas

Valdir Sarubbi (Bragança, Pará, 10 de outubro de 1939 – São Paulo, 8 de novembro de 2000)

Autor: ematosinho

Eduardo Matosinho é economista e sociólogo com bacharelado pela Universidade de São Paulo (USP). Tem 60 anos e é casado com Luiza Maria da Silva Matosinho e com ela tem um filho de nome João Alexandre da Silva Matosinho. Trabalha atualmente na Galeria Pontes (https://www.galeriapontes.com.br/), onde já está há 17 anos.

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