Cartão postal

Domingo no jardim público pensativo.
Consciências corando ao sol nos bancos,
bebês arquivados em carrinhos alemães
esperam pacientemente o dia em que poderão ler o Guarani.
Passam braços e seios com um jeitão
que se Lenine visse não fazia o Soviete.
Marinheiros americanos bêbedos
fazem pipi na estátua de Barroso,
portugueses de bigode e corrente de relógio
abocanham mulatas.
O sol afunda-se no ocaso
como a cabeça daquela menina sardenta,
na almofada de ramagens bordadas por Dona Cocota Pereira.

Rio, 1924.

Murilo Mendes (Juiz de Fora, MG, 13 de maio de 1901 — Lisboa, Portugal, 13 de agosto de 1975)

O imperador do sorvete

Chama o enrolador de charutos,
O musculoso, e pede que ele bata
Em xícaras caseiras cremes lúbricos.
Que as raparigas vistam as roupas
Que é seu costume usar, e os rapazes
Tragam flores no jornal do mês passado.
Que parecer termine em ser somente.
O único imperador é o imperador do sorvete.

Pega no armário de pinho,
Com os puxadores de vidro quebrados,
O lençol que ela bordou com pombas
E cobre todo o corpo dela, até o rosto.
Se um pé ossudo aparecer, verão
Que fria e dura que ela está.
Que fixe a lâmpada seu feixe quente.
O único imperador é o imperador do sorvete.

Wallace Stevens (Reading, Pensilvânia, 2 de outubro de 1879 — Hartford, Connecticut, 2 de agosto de 1955)

Autorretrato

A guerra dos cinqüenta
Está sendo travada no meu rosto
Reconheces o primitivo traçado?
Forças de ocupação abrem trincheiras, armam emboscadas.
Facções antagônicas avançam sobre a tua face,
Bloqueiam suas artérias,
Praticam pequenos furtos:
Molar, miopia, pai, memória.
Há anos bombardeiam
Feridas mal curadas,
Desembarcam camufladas
Nas praias minadas do sonho.
O combate se desenrola diante dos teus olhos.
Na vala comum do espelho resta uma sensação incômoda:
A vida é colaboracionista.

Augusto Massi (São Paulo, 1959) é um poeta, professor universitário e editor brasileiro.

Poema enviado pela amiga Maria Isabel Pellegrini Vergueiro

Waldecy de Deus e a arte naïf no Metrô

Companhia do Metropolitano de São Paulo – Metrô
Rua Augusta, 1.626 – Consolação, São Paulo – SP
Fones: (11) 3371-7232 / 3371-7259 | bibli@metrosp.com.br
De segunda a sexta, das 08h30 às 17h00 (exceto feriados e pontes)

Waldecy de Deus é uma pessoa de notória evidência no Naïf Brasileiro pela seriedade dada as suas pinturas, em detrimento às mensagens pueris, folclóricas e amenas, que as mesmas exprimem. São pinturas que magicamente deslizam pela paleta das cores, deixando impresso nas telas, o dia a dia das pessoas, seja no labor ou no lazer, de forma poética e singular, o que a torna membro legítimo do mundo Naïf. Waldecy pinta com emoção, respondendo à uma inquietude interior, personagens, paisagens e cenas, de forma intensa, sensível e detalhista, o que a consolida em um mundo onde a necessidade poética da arte se faz necessária frente a dureza de sua realidade.

Waldecy de Deus Fuhrman nasceu em Boa Nova, Bahia, em 1952. Transferiu-se para São Paulo em 1970, onde começou a pintar. Em 2020 completou 50 anos de carreira e com mais de 4 mil quadros pintados, já teve obras expostas na Alemanha, Suíça, França, Itália, Japão e Estados Unidos. Participou de diversas exposições individuais no Sesc, Santos, SP (1970); Grande Hotel da Barra, Salvador, BA (1971); Sesc, São Paulo, SP (1972/1979); Galeria KLM, SP (1974); Galeria Nuclearte, Osasco, SP (1975); Galeria Arumã, Ribeirão Preto, SP; Pintura Primitiva, Jabuticabal, SP (1976); Museu Dimitri Sensaud Lavaud, Osasco, SP (1978/1988); Via Cores, Sesi, São Paulo, SP (2003). Esteve presente ainda em inúmeras mostras coletivas, como Festival da Batida USIS, São Paulo (1969); Frankfurt, Alemanha; Instituto Brasileiro Americano, Washington, EUA; Universidade de Indiana, EUA (1971); 21º Pittori Naïfs Brasiliani, Itália; Birmingham Museum Art, Alabama, EUA (1973); 5º Naïfs no Paço Municipal, São Bernardo do Campo, SP (1979); Arte Negra e Raízes, Paço das Artes, São Paulo, SP (1981); Mito e Magia dei Colori, Napoles, Itália (1982); Centro de Arte Primitiva, SP (1992); O Místico na Arte Popular Brasileira, São Paulo, SP (1993); Bienal Brasileira da Arte Sesc, Piracicaba, SP (1994), Naïfs do Brasil, Sesc, Piracicaba, SP (1998), Suas obras estão incluídas no Dicionário de Artes Plásticas, MEC (1979); Artes Plásticas Brasil, 1989 e 1990, Editora Júlio Louzada (1989, 1990); Bienal Brasileira de Arte Naïf Sesc, Piracicaba, São Paulo (1994) entre outros.

Texto: Hélio Costa
Artista: Waldecy de Deus
@waldecydedeus / www.facebook.com/waldecydedeus.dedeus
Fotografia: Caio Tinoco @caiotinoco

Hélio Costa é documentarista, produtor cultural, multimídia e criador de diversas logomarcas e capas de livros. Hoje um dos maiores divulgadores da arte paraibana e um dos youtubers mais respeitado no meio artístico, e, dono de um imenso acervo fotográfico de artes plásticas da Paraíba. Membro da Academia Cabedelense de Letras – Paraibana.

Glauber Rocha: Em 2021 fará 40 anos de sua ausência

Glauber Pedro de Andrade Rocha (Vitória da Conquista, Bahia, 1939 – Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 1981). Cineasta, escritor. Um dos líderes do cinema novo, movimento de vanguarda da década de 1960, Glauber Rocha propõe um cinema alinhado à realidade socioeconômica do chamado “Terceiro Mundo”.

Durante o ensino médio, em Salvador, frequenta o Clube de Cinema da Bahia, dirigido pelo crítico Walter da Silveira (1915-1970). Entre 1956 e 1957, organiza no colégio as Jogralescas, espetáculos com dramatização de poemas modernistas; colabora como crítico em jornais; apresenta um programa de rádio sobre cinema e funda a produtora Yemanjá Filmes. Em 1958, viaja pelo sertão nordestino e entra em contato com a cultura popular. No mesmo ano, ingressa na faculdade de Direito da Bahia e frequenta a escola de teatro da instituição. Em 1959, lança o curta experimental Pátio, com a atriz Helena Ignez (1942), e filma Cruz na Praça, obra inacabada. Em 1961, inicia as gravações de Barravento, exibido no Brasil, em 1967.

Gravado na Praia de Buraquinho, na Bahia, o filme conta a história do retorno de Firmino à comunidade natal, formada por pescadores negros descendentes de escravos. O filme apresenta aspectos da cultura afro-brasileira (a capoeira, o samba de roda e o candomblé), ao mesmo tempo em que o personagem denuncia seu caráter alienante (o “feitiço religioso” considerado por Firmino como causa da passividade da comunidade diante da exploração da indústria pesqueira).

Em 1963, publica o livro Revisão Crítica do Cinema Brasileiro e, no ano seguinte, lança seu filme mais importante: Deus e o Diabo na Terra do Sol (1964). Neste longa, Glauber Rocha amplia sua crítica social ao associar a miséria do sertão à exploração do trabalho do sertanejo e ao fervor religioso. No interior dessa divisão, Deus e Diabo tornam-se forças sociais em conflito. A teatralidade do filme vinculada à literatura de cordel é visível na sequência em que os personagens Corisco, Dadá, Manuel e Rosa aguardam o encontro com Antônio das Mortes. Como destaca Ismail Xavier (1947) “[…] câmera e atores se deslocam de modo a traduzir visualmente o que é dito nos versos, numa representação que funde o espaço das imagens e o espaço da canção de cordel”.

Glauber Rocha traduz, de modo explícito, a célebre formulação do poeta russo Vladimir Maiakóvski (1893-1930): “não existe arte revolucionária sem forma revolucionária”. O diretor é reconhecido por se apropriar de inovações formais do cinema moderno europeu para filmar a realidade dos chamados “países subdesenvolvidos”. O uso da câmera na mão, a montagem descontínua, a teatralização do espaço e da encenação, a presença cênica da natureza, o improviso dos atores, são alguns dos recursos formais utilizados. Eles se incorporam às manifestações da cultura popular, sobretudo as religiosas, e às alegorias políticas, distanciando os filmes do cinema comercial.

A estreia do filme acontece alguns meses depois do golpe civil-militar, em abril de 1964, mas sua exibição é interditada pelo governo. Entretanto, com o êxito internacional no Festival de Cannes, o longa é liberado para maiores de 18 anos. O diretor viaja pela Europa e América, permanecendo fora do país até 1965, ano em que a apresenta o manifesto Estética da Fome.

Na volta ao Brasil, é preso com outros sete intelectuais por protestar contra o regime militar em reunião da Organização dos Estados Americanos (OEA). O episódio ganha repercussão internacional. Em 1966, realiza os documentários Amazonas Amazonas e Maranhão 66, que contribuem para a concepção estética e política do longa seguinte, Terra em Transe (1967), com exibição proibida no país durante meses.

A geografia da floresta amazônica e as imagens do comício populista de José Sarney (1930) são reencontradas nesse longa. Como no filme anterior, Terra em Transe condensa nos personagens as forças sociais em conflito, desta vez no Brasil da primeira metade da década de 1960. E exibe aspectos grotescos da realidade brasileira e a distância entre política institucional e população. O filme tem grande repercussão e torna-se referência cultural do final dos anos de 1960, influenciando produções de cinema, teatro e música popular.

Em 1960, realiza O Dragão da Maldade Contra o Santo Guerreiro, retornando ao tema do cangaço, às manifestações da cultura sertaneja e ao personagem Antônio das Mortes. Com longos planos-sequências e improviso dos atores, o filme alegoriza a conjuntura sociopolítica do Brasil da época. O dragão representa os limites políticos de uma luta que parece extemporânea à conjuntura nacional e à modernização conservadora da ditadura em fins dos anos 1960.

Seu último filme, A Idade da Terra, é um afresco de episódios decisivos da história da humanidade, projetados no Brasil do final da década de 1970. A narrativa fragmentada, o improviso dos atores, as cenas documentais e os planos-sequências procuram condensar a formação social do Brasil, dividida entre classe dirigente e população trabalhadora e expressa em manifestações culturais e religiosas.

Inspirada pela realidade brasileira, especialmente, a de fora dos grandes centros urbanos, a filmografia de Glauber Rocha é caracterizada sobretudo pela inovação da linguagem cinematográfica e pela incansável denúncia política e social durante os anos de repressão.

Fonte: Enciclopédia Itaú Cultural

Farewell

Odalisca vermelha (Matisse)

A indolência da odalisca em rosa rubra
respira paz de lânguido fervor.
A sensualidade se dilui:
pura cor.

Almoço sobre a relva (Manet)

Conversamos placidamente
junto a nudez
que pela primeira vez
não nos alucina.

De Arte em Exposição – in Farewell
Carlos Drummond de Andrade (Itabira, Minas Gerais, 31 de outubro de 1902 — Rio de Janeiro, 17 de agosto de 1987)

Sincretismo e Intolerância Religiosa – Convite enviado por Valdir Ricardo

2ª Exposição Coletiva de Artes Plásticas ARTEMAT / UNEMAT

A Exposição tem o objetivo de discutir o sincretismo religioso no Brasil, uma nação miscigenada, resultado de um longo processo de colonização e mistura de povos: indígena, europeu e africano. Na contemporaneidade, torna-se importante fomentar o debate sobre a intolerância religiosa no país, a partir do sincretismo que se estabeleceu, pois a população brasileira, mesmo sendo híbrida, tem a intolerância religiosa como elemento presente nos grupos sociais. As obras escolhidas para exposição promoverão uma discussão crítica sobre a temática, ressaltando o respeito à crença de cada indivíduo, pois o multiculturalismo é a nossa riqueza.

Artistas participantes: Adelice Queiroz; Agnaldo Rodrigues da Silva; Albina Oliveira Tibaldi; Carlos Alberto Bosque Junior; Eduardo Martins; Ellen De Lourdes Pelliciari Fanfoni; Idalina Gonçalves; Iram Almeida; Leandro Kelven Cavalcante Dourado; Neuracy Pedra Souza; Rafael Jonner; Sálvio Junior; Valdir Ricardo Francisco.

Curador: Prof. Dr. Agnaldo Rodrigues da Silva (Docente da Universidade do Estado de Mato Grosso, Presidente do Instituto Histórico e Geográfico de Cáceres, Líder do Grupo de Pesquisa em Estudos da Cultura e da Literatura Comparada – UNEMAT/ CNPq).

Os inscritos participantes receberão o certificado de participação com carga horária de 4h.

19/11/2020 – 26/11/2020 – 19:00 – 23:00

Fundação de Apoio ao Ensino Superior Público Estadual
(65) 3223-5166 | 3223-6339
Rua Comandante Balduíno, 676
Cáceres/ Mato Grosso – MT
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