Felipe Góes: Pinturas (Acrílica e guache sobre tela)

Felipe Góes (1983) vive e trabalha em São Paulo.
Formado em arquitetura, estudou história da arte com Rodrigo Naves, pintura com Paulo Pasta, e filosofia com Rubens Espirito Santo.

Realizou exposições individuais na Galeria Kogan Amaro (São Paulo, 2019), Galeria Murilo Castro (Belo Horizonte, 2018), Instituto Moreira Salles (Poços de Caldas, 2017), Galeria Virgílio (São Paulo, 2016 e 2018), Central Galeria de Arte (São Paulo, 2014), Phoenix Institute of Contemporary Art (Arizona, EUA, 2014) e Usina do Gasômetro (Porto Alegre, 2012).

Participou das exposições coletivas “Mapping Spaces”(Kentler International Drawing Space, New York, EUA, 2016), “2ª Bienal Internacional de Asunción”(Assunção, Paraguai, 2017), “Coletivo Terça ou Quarta + Acervo Municipal” (Araraquara, 2014 – patrocínio: PROAC-ICMS), “Arte Praia 2013” (Natal, 2013 – patrocínio: Funarte) e “20 e poucos anos – portfólio” (Galeria Baró, São Paulo, 2011). Participou de residências artísticas no Phoenix Institute of Contemporary Art (Arizona, EUA, 2014) e Instituto Sacatar (Itaparica, BA, 2012).

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O que penso sobre as políticas públicas de geração de emprego e renda no Brasil

Em agosto de 2006, quando estudava sociologia tentei agregar meus conhecimentos de economia com minha formação em ciências sociais e fiz um projeto de mestrado. Ele não foi aceito na Academia, mais tenho certeza que o tema está tão atual como nunca. Basta ver o que se passa em Brasília com a tentativa do governo de flexibilizar os direitos trabalhistas e o conflito que esse ato político está gerando. Quase dez anos depois desse projeto mostro aos leitores do “Vivendocidade” o que eu pensava sobre esse assunto na época. Esse tema está na ordem do dia e até me lembro dos ensinamentos de Keynes que vi nos cursos de Macroeconomia e de teoria do valor. O Brasil se democratizou mais o pensamento clássico continua tão vivo como nunca. Ora pela direita, ora pela esquerda, se isso ainda tem algum sentido. Vejamos…

Minha pesquisa visava analisar as políticas públicas relacionadas ao mercado de trabalho no Brasil e que tinha como intuito o combate ao desemprego, a proteção dos trabalhadores desempregados e a aplicação dos instrumentos para a promoção, a proteção do emprego e a geração de renda. O objetivo principal daquele estudo era analisar o mercado de trabalho no Brasil, estudar o processo de reestruturação produtiva vivida em nossa economia e fazer uma análise detalhada da desigualdade no país e dos problemas sociais por ela gerados.

A pesquisa pretendia estudar as referidas políticas públicas para a geração de emprego e renda no sentido de aprofundar o conhecimento sobre os seus resultados objetivos alcançados até o ano de 2000 na proteção ao desempregado. Iriam ser analisados os programas que integram o Sistema Público de Emprego, como o seguro-desemprego, o programa de intermediação de mão-de-obra, o programa de qualificação profissional e, mais especificamente, o Plano Nacional de Formação Profissional (Planfor), o Programa de Geração de Emprego e Renda (Proger) e a gestão e o funcionamento do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS).

Como referencial teórico adotou-se a linha de pesquisa que engloba os temas do trabalho e do emprego e tem como objeto as relações sociais e as formas de organização do trabalho. Seria usada a teoria sociológica elaborada por Karl Marx no estudo das situações de trabalho e da problemática do emprego (e do desemprego).

Na época podia se ver pela nossa história que na conjuntura recessiva que marcou o início dos anos de 1980, embora o tema do desemprego (foco de nossa investigação) tivesse adquirido uma grande visibilidade social, a forma de intervenção de agências estatais, ou os mecanismos do sistema público, eram menos desenvolvidos e atuantes do que o foram nos anos de 1990.

No entanto, salta aos olhos que a importante questão social do desemprego se colocava de maneira particularmente crítica em nosso país e sobre esse tema que resolvi me debruçar. Hoje ele está mais atual do que nunca.

Meu interesse maior era refletir sociologicamente sobre a situação social do desemprego e as suas implicações institucionais e públicas, pois esse tema se constitui num interessante fenômeno para interrogar e compreender sociologicamente as mudanças do mundo do trabalho e, em decorrência, da sociedade brasileira. Observa-se que tanto a noção de desemprego quanto o modo pela qual o desemprego é figurado como uma questão social são reveladores da compreensão que nossa sociedade tem do trabalho, do emprego e do lugar que se atribui a estas importantes dimensões sociais.

Justamente a preocupação era que o desenvolvimento das políticas públicas de geração de emprego e renda desenvolvidas pelo Estado brasileiro, tentando medir quantitativamente através das estatísticas oficiais e explicar qualitativamente em que medida foram enfrentadas institucionalmente as questões claramente sociais do desemprego e da baixa renda.

O interesse por esse assunto remonta à minha experiência como sociólogo e economista atuando no Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Sócio-Econômicos (Dieese) por quase quatorze anos, onde o tema do emprego (e do desemprego) e das políticas públicas para estimulá-lo, no caso do emprego (e enfrentá-lo, no caso do desemprego) estiveram sempre presentes. Esse ano esse departamento fará em dezembro 60 anos.

Vê-se que, historicamente, a questão do desemprego procurou ser melhor entendida e foi inserida na agenda social por volta da década de 1980, em meio a um grande esforço de fazer cumprir as promessas de modernização e de democratização da sociedade brasileira, onde era importante reconhecer a responsabilidade que essa mesma sociedade teria sobre o destino dos trabalhadores.

O tema do projeto que pretendi desenvolver seguia a linha de pesquisa da área da sociologia do trabalho e essa pesquisa procuraria dar um enfoque multidisciplinar ao tema proposto. A sociologia pode ser entendida como uma área do conhecimento humano que possui uma grande abrangência, possibilitando uma visão de conjunto dos vários acontecimentos da vida social, sejam eles relativos à economia, à política, à esfera simbólica e cultural.

Partindo de um tema social que é a questão do emprego, estudaria as políticas públicas adotadas no Brasil para gerá-lo tendo a preocupação de entendê-las em algumas de suas esferas como a social, a política, a econômica e a estatística. A esfera social aparece quando estudamos os problemas das desigualdades sociais gerados pelo desemprego.

Ambicionava trabalhar a temática sociológica do trabalho e sociedade, sendo que um dos objetivos da pesquisa era analisar as mudanças no trabalho no mundo contemporâneo e seus desdobramentos quanto à gestão do tempo social, as propostas institucionais de geração de emprego e renda e aos movimentos sociais. Esse projeto não foi aceito. Hoje vemos que nada mudou, pelo contrário, se agravou.

O período estudado pode ser justificado pelo fato de que os problemas do mercado de trabalho se agravam desde a década de 1980, mas é somente a partir da década subseqüente que o governo brasileiro começou a adotar alguns tipos de políticas sociais com o claro caráter reativo, voltadas basicamente para a correção pontual das distorções de ordem trabalhistas.

As políticas públicas de emprego que visam a formação e a qualificação profissional e que prestem serviços de intermediação e recolocação de mão-de-obra passaram desde os anos de 1990 a assumir maior importância no país. Observamos que também se ampliou a cobertura do seguro contra o desemprego, porém em ritmo e escala bem menores do que o que se poderia esperar.

Entre as políticas públicas de geração de emprego e renda destacam-se no Brasil o Programa de Geração de Emprego e Renda (Proger), instituído em 1994; o Plano Nacional de Educação Profissional (Planfor), instituído em 1996; e o Programa de Seguro-Desemprego, instituído em 1986, confirmado pela Constituição de 1988 e estruturado em sua forma definitiva em janeiro de 1990.

O Proger e o Planfor tratam-se de dois programas, gestados e geridos no âmbito do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), o maior fundo público que mobiliza recursos para o planejamento de ações no âmbito do trabalho. O Proger é uma linha de crédito subsidiado, voltada para as micro e pequenas empresas, cujos propósitos são a ampliação de seus recursos tecnológicos, a capacitação técnica de seus proprietários e trabalhadores e a melhoria de suas condições de inserção nos mercados em que atuam. Nesse programa tem-se que a contrapartida pelas taxas subsidiadas de juros está exatamente no compromisso de geração de empregos formais.

No Brasil foram tentadas no passado algumas experiências locais de programas de geração de emprego e renda. No entanto, essas experiências se caracterizaram por serem ações inteiramente desarticuladas. De acordo com Beatriz Azevedo na obra denominada “Políticas públicas de emprego: a experiência brasileira”, escrito e, 1998, somente a partir de 1994 é que foram criadas condições jurídico-institucionais para que o governo federal pudesse tomar a iniciativa de propor e coordenar programas nacionais visando redefinir a amplitude e o conteúdo das políticas públicas de emprego.

O mercado de trabalho brasileiro é caracterizado pelo elevado grau de informalidade, pelas relações precárias de trabalho, pelo desemprego de longa duração, pelas deficiências crônicas no sistema formal de educação, pelos baixos níveis salariais e pelas limitadas políticas sociais. Sendo assim, o problema de nossa pesquisa será investigar esse mercado de trabalho e estudar quais seriam as principais políticas públicas que vem sendo desenvolvidas pelo estado brasileiro para minimizar os problemas sociais oriundos desse quadro adverso.

Desde àquela época o Sistema Público de Emprego no Brasil estava estruturado para atender a cinco programas de atendimento aos trabalhadores: o seguro-desemprego; o programa de intermediação da mão-de-obra; o programa de formação, treinamento e qualificação profissional; o programa de créditos para a geração de emprego e renda; e o programa de apoio à produção de um banco de dados sobre o mercado de trabalho.

Levaria em conta que a formulação de políticas de emprego não deveria desconsiderar alguns aspectos fundamentais do mercado de trabalho brasileiro, com destaque para a sua grande heterogeneidade, o elevado e persistente desemprego, o aumento recente da precariedade das relações de trabalho assalariadas e a enorme desigualdade de rendimentos e de salários, além dos baixos níveis de educação da força de trabalho. Esses fatores somados, além de dificultarem o mapeamento e a formulação de políticas públicas de emprego, exigem também que estas políticas não estejam diretamente atreladas a ele mesmo e que sejam ativas em relação aos rearranjos das políticas macroeconômicas.

Assim sendo, uma de minhas hipóteses é que em países como o Brasil nem deveria existir opção estratégica entre políticas passivas ou ativas. Definem-se políticas passivas como sendo aquelas que consideram o nível de emprego como um dado, tendo por objetivo apoiar financeiramente o trabalhador desempregado.

Como já foi dito anteriormente, essa pesquisa se insere dentro da teoria sociológica no tradicional núcleo teórico já trabalhado por importantes autores clássicos como Durkheim e Spencer, em uma linha denominada funcionalista, e por Marx, que segue uma abordagem conhecida como teoria crítica ou dialética. Seguiria na elaboração dessa pesquisa a linha de abordagem elaborada por Marx e atualizada por seus seguidores.

Resumidamente, as técnicas de investigação seriam a consulta à bibliografia existente sobre o tema, a pesquisa junto aos bancos de dados sobre mercado de trabalho e as entrevistas com os agentes sociais ligados ao assunto abordado. Averigüei que o material a ser pesquisado encontrava-se em bibliotecas e na Internet. Outras fontes seriam os órgãos do governo e institutos de pesquisa, além de entrevistas e conversas com autoridades, informantes e especialistas. Serão consultados também CD-ROM’s, anuários, jornais, revistas, entre outros.

O tratamento dos dados seria feita na forma de tabulações das entrevistas coletadas e na confecção de tabelas sintéticas, separadas por temas de acordo com os dados estatísticos coletados junto às fontes de dados descritas acima.

Clássico é clássico seja de esquerda, como essa visão, ou de direita, como Keynes, que na época não abordei. Mais como ele próprio disse um dia “no longo prazo estaremos todos mortos”. E viva a democracia tupiniquim!

Artigo publicado originalmente no site “Vivendocidade”, de Carlos Correa Filho (08/04/2015)

O Dia Internacional da Mulher visto por um homem simples e por uma mulher de garra

Nessas faltas de água de março peço a ajuda de Fátima Pacheco Jordão, socióloga e pesquisadora da FPJ (Fato, Pesquisa e Jornalismo), para contar um pouco da história desse dia tão falado. Vamos aos fatos:

A origem histórica do dia 8 de março se deu há 158 anos atrás quando, em 1857, 130 operárias americanas morreram queimadas após serem impedidas de sair de uma fábrica têxtil em Nova Iorque. A atitude dos patrões era uma represália ao movimento grevista das costureiras, que pleiteavam redução da jornada diária de trabalho. Naquela época, as mulheres não tinham voz – nem socialmente, nem politicamente. Eram discriminadas no trabalho, não tinham direito a voto e nem podiam participar dos espaços de representação política.

Dando seqüência aos fatos, em 1910 foi decidido em uma conferência internacional de mulheres realizada na Dinamarca comemorar esse dia como o “Dia Internacional da Mulher” em homenagem àquelas mulheres americanas mortas. Naquela ocasião as mulheres reivindicavam, além do direito de voto e de participação pública, o direito de trabalhar, de treinamento vocacional e do fim da discriminação no trabalho.

Desde 1975, em sinal de apreço pela luta das mulheres, as Nações Unidas decidiram consagrar também o dia 8 de março como o “Dia Internacional da Mulher”. Seria importante lembrar que aquela data histórica teve um grande impacto na legislação trabalhista americana e mundial e as péssimas condições de trabalho das mulheres sempre foram invocadas em todas as comemorações do “Dia Internacional da Mulher”. E essa luta continua até os dias de hoje.

No Brasil temos como marco das conquistas das mulheres a data de 24 de fevereiro de 1932, quando foi instituído o voto feminino. Desta forma, as mulheres conquistavam, depois de muitos anos de reivindicações e discussões, o direito de votar e serem eleitas para cargos no Executivo e Legislativo.

Na política brasileira o espaço ocupado pelas mulheres tem crescido bastante, mais ainda temos muitos desafios pela frente. Um dos principais é trazer para o mundo político a competência e a sensibilidade do trabalho feminino. Espero, cada vez mais, que consigamos superar as dificuldades conseqüentes do próprio gênero que, muitas vezes, ao impor obrigações maternas, reduzem o espaço de participação das mulheres na vida política.

As mulheres que colaboraram nessa conquista foram, entre tantas outras, Alice Tibiriça, uma mineira de Ouro Preto, que sugeriu ao presidente Getútio Vargas, em 1932 a criação do Dia das Mães e também trouxe as comemorações pelo Dia Internacional da Mulher ao Brasil em 1947. Outras foram Anita Garibaldi, Chiquinha Gonzaga, a primeira mulher a reger uma orquestra no Brasil, e Pagu, do Modernismo de 1922.

Temos muito que avançar e estabelecer igualdade de participação nos partidos e ampliar ainda mais a presença delas no Parlamento e na vida pública. Segundo o ranking do IPU na posição das mulheres brasileiras nos países da América Latina está em 18º lugar, atrás de países como Cuba, Chile, Paraguai, Colômbia e Uruguai. Torcemos para que a cultura de participação política brasileira das mulheres se consolide dia após dia, para que as lideranças femininas tornem-se, efetivamente, quadros políticos de relevância.

Espero que tenham gostado, homens e mulheres, leitores desse site, e que voltem sempre a nos prestigiar com sua visita.

Artigo publicado originalmente no site “Vivendocidade”, de Carlos Correa Filho (06/03/2015)

Batalha do Jenipapo: importante luta pela independência do Brasil, no Piauí

Dia 13 de dezembro do ano que terminou viajei por vinte dias pelo Piauí e visitei o monumento dos heróis da Batalha do Jenipapo ocorrida em 13 de março de 1823. Confesso que me impressionei muito com a história viva que vi de parte desse nosso enorme Brasil e com o desconhecimento geral aqui no sul maravilha sobre esse importante acontecimento. Convido os leitores do “Vivendocidade” para mergulharem nessa história que escrevi em parceria com o professor de história piauiense Paulo Silva de Sousa.

Campo Maior, onde a batalha aconteceu próxima ao Riacho Jenipapo, fica a 84 km da capital do Piauí (Teresina) e caracteriza-se pela presença marcante da palmeira Carnaúba (“Copernicia prunifera”), que lhe rendeu o apelido de “Terra dos Carnaubais”. Sua principal atração turística é o Açude Grande, hoje infelizmente bem poluído e maltratado.

Essa luta foi a mais violenta e única batalha sangrenta pela Independência do Brasil e pela consolidação do território nacional, e foi vencida pelos portugueses.

Seus principais líderes foram Leonardo Castelo Branco, José Pereira Filgueiras, Luis Rodrigues Chaves, Alexandre Nereu, João da Costa Alecrim e Tristão Gonçalves Alencar, cujos corpos estão enterrados no cemitério localizado atrás do monumento, em túmulos rústicos de pedra e cruz de madeira. As estatísticas mostram que houve entre brasileiros e portugueses um total de 200 mortos ou feridos e 542 prisioneiros.

Além da população do Piauí, maranhenses e cearenses participaram do levante popular contra as tropas lideradas pelo major João José da Cunha Fidié (veterano das guerras napoleônicas), que desejavam manter a região sob domínio português e sufocar os movimentos de independência. O embate pode ser visto como um dos momentos chave da adesão da província piauiense ao processo emancipatório brasileiro.

Os brasileiros lutaram com instrumentos simples, não com armas de guerra e não tinham experiência de guerra. Perderam a batalha, mas fizeram com que a tropa desviasse o seu destino.

A data não consta nos livros de História e poucos sabem do ocorrido, mesmo no Piauí, onde ocorreu a batalha. Contudo, após alguns movimentos por parte de políticos, de historiadores e da população, a data foi acrescida à bandeira do Piauí e está em curso a implantação do estudo da Batalha do Jenipapo na disciplina de História.

A história foi mais ou menos assim: Após a declaração da independência do Piauí feita a 19 de outubro de 1822, em Parnaíba, o comandante português reúne suas tropas e parte de Oeiras em direção à Parnaíba, a 13 de novembro, para combater os emancipacionistas brasileiros.

Fidié chega a Campo Maior e, no dia 13 de março de 1823, pela manhã, tem início a batalha entre suas tropas bem armadas e experientes e brasileiros sem treinamento militar, utilizando paus, pedras e outros materiais de pouco poder ofensivo. Devido a superioridade bélica, o que se viu à beira do Jenipapo foi um massacre.

Mesmo com a derrota do movimento popular, a Batalha do Jenipapo tornou-se decisiva para afastar o major Fidié do Piauí e consolidar a independência e a unidade territorial do Brasil. Enfraquecidas, as tropas fiéis à coroa seguiram para Caxias, no Maranhão, onde foram derrotadas por piauienses, maranhenses e cearenses, a 31 de julho de 1831.

Essa Batalha é um capítulo fundamental no processo de consolidação do território brasileiro e o 13 de março passou a ser estampada na bandeira do Piauí, a partir de 2005, após aprovação da Assembléia Legislativa daquele estado. Lá é feriado estadual.


Legenda das fotos:

1) Arte pictórica de Francisco Paz retratando o conflito;

2) Afresco patrocinado pela Prefeitura de Campo Maior;

3) Cemitério dos heróis da batalha localizada na parte de trás do Monumento da Batalha do Jenipapo.

Artigo publicado originalmente no site “Vivendocidade”, de Carlos Correa Filho (28/01/2015)

Dia Nacional da Consciência Negra

Em nova colaboração ao site “Vivendocidade” falarei um pouco sobre a história do Dia Nacional da Consciência Negra. Espero que seja proveitoso! Como todos sabemos, no dia 20 de novembro comemora-se a data da Consciência Negra que marca o aniversário da morte de Zumbi ocorrida em 1695, portanto, há 318 anos atrás. Essa data foi criada em 2003 pela Lei nº 10.639 e tornou obrigatório, a partir de então, o ensino da História da África e dos afro-brasileiros no Ensino Fundamental e Médio. Essa lei chega aos dez anos e seu maior desafio ainda é o da superação do racismo na educação.

Zumbi (Palmares, Alagoas, 1655 – Viçosa, Alagoas, 20 de novembro de 1695) nasceu livre no quilombo dos Palmares, localizado na Serra da Barriga, maior dos quilombos formados no período colonial, chegando a ter quase 30 mil habitantes. Zumbi foi capturado e entregue a um missionário português quando tinha aproximadamente seis anos. Batizado “Francisco”, ele recebeu os sacramentos, aprendeu português e latim, e ajudava diariamente na celebração da missa.

Apesar destas tentativas de aculturá-lo, Zumbi escapou em 1670 e, com quinze anos, retornou ao seu local de origem. Ele então se tornou conhecido pela sua destreza e astúcia na luta e já era um estrategista militar respeitável quando chegou aos vinte e poucos anos. Ele chefiou os negros nos combates contra bandeirantes e capangas que queriam escravizá-los novamente. Foi traído e morto numa emboscada aos 40 anos de idade na serra Dois Irmãos, em Pernambuco, depois de ser barbaramente perseguido pelo bandeirante Domingos Jorge Velho e traído por Antônio Soares, um de seus homens de confiança, que havia sido capturado e torturado dias antes.

Seu corpo foi levado para Recife, onde foi exposto para amedrontar os outros escravos. Sem uma liderança, Palmares foi totalmente destruída, muitos negros voltaram à escravidão, outros fugiram e alguns foram perdoados pelos senhores de então.

Ele foi o último líder do pioneiro e mais importante quilombo existente no Brasil, Palmares, por este motivo ele é considerado pelo movimento negro o símbolo maior da resistência contra a escravidão em nosso país. Vemos pela nossa história que a abolição da escravatura só veio a ser decretada em 1888. Porém, os negros sempre resistiram e lutaram contra a opressão e as injustiças advindas da escravidão, como nos mostra a resistência estabelecida por Zumbi dentro do quilombo de Palmares.

Essa consciência é muito importante, pois mostra, principalmente para as nossas crianças, a contribuição sócio-cultural dos negros, e ajuda a combater em nossa sociedade o racismo e as discriminações sociais.


A obra acima denomina-se “Senzala”, mede 50 x 134 x 40 cm e é uma escultura em madeira feita por Antonio Julião que é mineiro de Prados e tornou-se o maior expoente do grupo de artistas conhecido como “família Julião”. Ele realiza suas obras com força criativa, originalidade e evidentes recursos técnicos, em concepções de grandes proporções, em geral colunas esculpidas em um único tronco. Seus temas freqüentemente revelam crítica social e ambiental, ao expressarem ao mesmo tempo temas como o da senzala, de evidente conotação social e outros que retratam a visão utópica do homem em harmonia com a natureza, no paraíso. Essa obra faz parte do acervo da Galeria Pontes (www.galeriapontes.com.br), inaugurada em setembro de 2008, é especializada em arte popular brasileira. Ela está localizada em São Paulo e atualmente funciona apenas como galeria virtual.

Artigo publicado originalmente no site “Vivendocidade”, de Carlos Correa Filho (13/11/2013)

Pierre Bourdieu e a teoria da simbolização

Na sociologia contemporânea a linha de pesquisa sobre cultura, simbolização e representações sociais reúne pesquisas variadas sobre instituições, expressões culturais, história intelectual e processos intelectuais contemporâneos, reflexividade e sociologia da sociologia. Dito isso, seguimos com nossa contribuição periódica ao site “Vivendocidade” analisando um pouco da obra de Pierre Bourdieu (Denguin – França, 1 de agosto de 1930 — Paris, 23 de janeiro de 2002).

Em termos teóricos, a obra sociológica de Pierre Bourdieu trata com destaque das teorias da simbolização. Sua discussão sociológica centralizou-se, ao longo de sua obra, na tarefa de desvendar os mecanismos da reprodução social que legitimam as diversas formas de dominação. Para empreender esta tarefa, esse sociólogo francês desenvolve conceitos específicos, retirando os fatores econômicos do epicentro das análises da sociedade, a partir de um conceito concebido por ele como violência simbólica, no qual Bourdieu advoga acerca da não arbitrariedade da produção simbólica na vida social, advertindo para seu caráter efetivamente legitimador das forças dominantes, que expressam por meio delas seus gostos de classe e estilos de vida, gerando o que para ele pretende ser uma distinção social.

Em sua obra Bourdieu criou uma vasta terminologia própria, onde se pode destacar, entre outras, a definição de capital simbólico, que se especifica como capital acadêmico, intelectual, de prestígio, inicial, social, de conceitos, de métodos ou de técnicas; distinção e habitus; mercado de bens simbólicos, investimento simbólico, exército de reserva intelectual; lucro absoluto, simbólico ou científico; gratificação material e simbólica; golpe de estado simbólico, atentado simbólico, política simbólica, jurisprudência cultural, entre outros.

Destacamos, a seguir, três conceitos centrais da teoria proposta por Bourdieu que são campo, habitus e capital. O primeiro é o conceito de campo que representa um espaço simbólico, no qual lutas dos agentes determinam, validam, legitimam representações. É o poder simbólico. Nele se estabelece uma classificação dos signos, do que é adequado, do que pertence ou não a um código de valores. No campo da arte, por exemplo, a luta simbólica determina o que é erudito, ou o que pertence à indústria cultural. Determina também quais valores e quais rituais de consagração as constituem, e como elas são delineadas dentro de cada estrutura. No campo, local empírico de socialização, o habitus constituído pelo poder simbólico surge como um todo e consegue impor significações, datando-as como legítimas. Os símbolos afirmam-se, assim, na noção de prática, como os instrumentos por excelência de integração social, tornando possível a reprodução da ordem estabelecida.

O segundo conceito é o de habitus e relaciona-se à capacidade de uma determinada estrutura social ser incorporada pelos agentes por meio de disposições para sentir, pensar e agir. O terceiro é o de capital, que é um conceito que discute a quantidade de acúmulo de forças dos agentes em suas posições no campo. Ele distingue, no decorrer de sua obra, quatro principais tipos de capital: o social, o cultural, o econômico e o simbólico (no qual se inclui o científico).

Seu livro “Meditações pascalianas”, de 1997, pode ser considerada uma obra mais filosófica do que sociológica. Sua intenção foi, antes de tudo, expressar conceitos com o maior rigor científico possível e superar a “bela prosa”, carregada de “mitologia política”, de uma representação do mundo social limitada a uma fração específica da classe dominante, oriunda da Escola Normal Superior que o formou. Esta obra enfoca diretamente as teorias da simbolização em um capítulo inteiro, de número V, denominado “Violência simbólica e lutas políticas”, e em pelo menos dois artigos, um apresentado no capítulo II, denominado “A forma suprema da violência simbólica”, e outro, no último capítulo de número VI, denominado “O capital simbólico”.

Bourdieu trata nesse livro de uma questão epistemológica importante que é o fato de que a diferença do objeto teórico residir no ato constitutivo da ciência que opera sobre o real uma operação de inscrição de categorias constitutivas, ou, ao contrário, essa diferença resulta de elementos empiricamente verificáveis, anteriores e externos à interrogação questionadora no campo. Esta questão epistemológica possui uma grande atualidade sociológica e é por ela que passa a diferença entre a razão escolástica e o saber prático.

Exporemos a seguir os principais pontos discutidos por Bourdieu nesse livro a respeito das teorias da simbolização. Para mantermos a mesma ordem cronológica apresentada no livro, comecemos pelo artigo do capítulo II. No texto “A forma suprema da violência simbólica” Bourdieu afirma que a racionalidade constitui, logicamente, um móvel central de competição das lutas históricas, isto, segundo ele, porque a razão tende a se tornar uma força histórica cada vez mais decisiva. Em seguida toca no ponto essencial ao afirmar que a forma por excelência da violência simbólica é o poder exercido pelas vias da comunicação racional, ou seja, com a adesão dos que estão forçados a conceder sua aquiescência ao arbitrário da força racionalizada.

Resume seu ponto de vista afirmando que será preciso mobilizar cada vez mais recursos e justificações técnicas e racionais para dominar, e os dominados deverão se servir ainda mais da razão para se defender contra formas crescentemente racionalizadas de dominação. Neste sentido as ciências sociais desempenham um papel importante, pois são, segundo Bourdieu, as únicas capazes de desmascarar e de fazer frente às estratégias de dominação inteiramente inéditas para as quais contribuem por vezes como nutrientes e fontes de inspiração. Afirma que elas deverão escolher entre dois partidos: posicionar seus instrumentos racionais de conhecimento a serviço de uma dominação cada vez mais racionalizada, ou, então, analisar racionalmente a dominação, em especial a contribuição do conhecimento racional para a monopolização de fato dos ganhos da razão universal.

Bourdieu finaliza seu curto artigo afirmando que a consciência e o conhecimento das condições sociais dessa espécie de escândalo lógico e político que vem a ser a monopolização do universal sinalizam os fins e os meios de uma luta política permanente em prol da universalização das condições de acesso ao universal.

No capítulo V do livro Bourdieu analisa a violência simbólica e as lutas políticas, com destaque para o artigo sobre o poder simbólico. Após uma breve introdução, o autor inicia o capítulo com o artigo “Libido e illusio” onde diz que os novatos trazem consigo disposições previamente constituídas no interior do grupo familiar socialmente situado às exigências expressas ou tácitas de campo. Afirma que somente por meio de toda uma série de transações insensíveis tais disposições se transformam aos poucos em disposições específicas.

Mais à frente Bourdieu observa que a forma originária da illusio é o investimento no espaço doméstico, lugar de um processo complexo de socialização do sexual e de sexualização do social. Afirma, então, que a sociologia e a psicologia deveriam juntar esforços no intuito de analisar a gênese do investimento num campo de relações sociais no qual a criança se encontra cada vez mais envolvida, e que constitui tanto o paradigma como o princípio do investimento no jogo social.

Detecta que a raiz antropológica da ambigüidade do capital simbólico seria o princípio de uma busca egoísta das satisfações do “amor-próprio” que é a procura fascinada pela aprovação de outrem, como a busca da glória e da honra, por exemplo. Para Bourdieu, o capital simbólico assegura formas de dominação, que envolvem a dependência perante os que ele permite dominar.

No artigo seguinte, denominado “Uma coerção pelo corpo”, Bourdieu comenta que a análise da aprendizagem e da aquisição de disposições conduz ao princípio propriamente histórico da ordem política e complementa dizendo que a força simbólica constitui uma forma de poder que se exerce sobre os corpos, diretamente, e como que por encanto, a despeito de qualquer constrição física e que ela deriva suas condições de possibilidade do imenso trabalho prévio que se torna necessário a fim de operar uma transformação durável dos corpos e produzir as disposições permanentes despertadas e reativizadas pela ação simbólica.

Para Bourdieu, o habitus é a energia potencial, a força dormente, de onde a violência simbólica extrai sua misteriosa eficácia. A eficácia das necessidades externas se apóia na eficácia de uma necessidade interna e as disposições constituem o verdadeiro princípio dos atos práticos de conhecimento e de reconhecimento da fronteira mágica entre dominantes e dominados, atos desencadeados pela magia do poder simbólico, atuantes como um gatilho.

Esclarece que a violência simbólica é essa coerção que se institui por intermédio da adesão que o dominado não pode deixar de conceber ao dominante (portanto, à dominação), quando dispõe apenas de instrumentos de conhecimento partilhados entre si e que fazem surgir essa relação como natural, pelo fato de ser a forma incorporada da estrutura da relação de dominação.

O efeito da dominação simbólica se exerce na obscuridade das disposições do habitus, em que estão inscritos os esquemas de percepção, de apreciação e de ação que fundam uma relação de conhecimento e de reconhecimento, ambos práticos, mas profundamente obscura para si mesma.

No seu artigo seguinte denominado “O poder simbólico”, Bourdieu afirma que mesmo quando repousa sobre a força nua e crua, a das armas ou a do dinheiro, a dominação possui sempre uma dimensão simbólica. Acrescenta que, por sua vez, os atos de submissão, de obediência, são atos de conhecimento e de reconhecimento os quais mobilizam estruturas cognitivas suscetíveis de serem aplicadas a todas as coisas do mundo e, em particular, às estruturas sociais.

A teoria do conhecimento do mundo social é uma dimensão fundamental da teoria política. Mais à frente afirma que em nossas sociedades, o Estado contribui, em medida determinante, para a produção e reprodução dos instrumentos de construção da realidade social, onde ele exerce em bases permanentes uma ação formadora de disposições duráveis, por meio de todas as constrições e disciplinas a que submete uniformemente o conjunto dos agentes.

A construção do Estado se faz acompanhar pela construção de uma espécie de transcendental histórico comum que se torna imanente a todos os seus “sujeitos”, ao cabo de um longo processo de incorporação. Mediante o enquadramento imposto às práticas, o Estado institui e inculca formas simbólicas comuns de pensamento, contextos sociais da percepção, do entendimento ou da memória, formas estatais de classificação.

Com isso, o Estado cria as condições de uma orquestração imediata dos habitus que constitui, por sua vez, o fundamento de um consenso sobre esse conjunto de evidências partilhadas, capazes de conformar o senso comum.

Finalmente, no último capítulo de número VI, Bourdieu fecha brilhantemente o seu livro com o artigo denominado “O capital simbólico”, onde afirma que, dentre todas as distribuições, uma das mais desiguais e mais cruéis é a repartição do capital simbólico, ou seja, da importância social e das razões de viver. Mostra que na hierarquia das dignidades e indignidades, quando comparada à hierarquia das riquezas e dos poderes, contrapõe-se ao pária estigmatizado, que servem de exemplo o judeu, o negro dos guetos e o árabe ou o turco dos subúrbios operários das cidades européias. Estes carregam a maldição de um capital simbólico negativo.

Ele afirma que não existe pior privação do que a dos derrotados na luta simbólica pelo reconhecimento, pelo acesso a um ser social socialmente reconhecido.

Mostra que todo tipo de capital (econômico, cultural, social) tende a funcionar como capital simbólico quando alcança um reconhecimento explícito ou prático, o de um habitus estruturado segundo as mesmas estruturas do espaço em que foi engendrado.

Artigo publicado originalmente no site “Vivendocidade”, de Carlos Correa Filho (06/07/2013)