Porquinho-da-Índia

Quando eu tinha seis anos
Ganhei um porquinho-da-índia.
Que dor de coração me dava
Porque o bichinho só queria estar debaixo do fogão!
Levava ele pra sala
Pra os lugares mais bonitos mais limpinhos
Ele não gostava:
Queria era estar debaixo do fogão.
Não fazia caso nenhum das minhas ternurinhas . . .

— O meu porquinho-da-índia foi minha primeira namorada.

Manuel Bandeira (Recife, 19 de abril de 1886 — Rio de Janeiro, 13 de outubro de 1968)

Por estes campos sem fim

Por estes campos sem fim,
onde a vista assim se estende,
que verei, triste de mim,
pois ver-vos se me defende?

Todos estes campos cheios
são de saudade e pesar,
que vem para me matar,
debaixo de céus alheios.
Em terra estranha e em ar,
mal sem meio e mal sem fim,
dor que ninguém não entende,
até quão longe se estende
o vosso poder em mim!

Sá de Miranda (Coimbra, Portugal, 28 de agosto de 1481 — Amares, Portugal, 15 de março de 1558), In “Antologia Poética”

Maria de Lourdes Alesse: Associação dos Pintores com a Boca e os Pés (APBP)

Maria de Lourdes Alesse

👨‍🎨 Artista plástica da APBP

Estilo de pintura: Com os pés
Técnica: Acrílica
Título da obra: “Carrinheiro”

Conhecida por Lurdinha, pintava com os pés, e faleceu em 29/11/2023. Olimpiense, ela participou da Associação dos Pintores com a Boca e os Pés, instituição fundada em 1956, no principado de Liechtenstein, entre a Áustria e a Suíça. Desde 1968, ela se manteve com a venda dos quadros. Além de comercializadas, as obras também se transformam em cartões e calendários, entre outros artigos. Seu trabalho variou entre reprodução de fotos, imagens do tradicional folclore de Olímpia, gravuras de cavalos, bois e natureza morta. Ela trabalhava em um ateliê adaptado em um dos cômodos da casa de sua irmã, onde morava em Rio Preto, desde o falecimento de seu pai. A superação é a palavra que moveu a vida da artista plástica. Natural de Olímpia – SP, em 10 de novembro de 1950, nasceu sem os braços. Devido à má-formação, o médico não deu mais do que nove dias de vida para o pequeno bebê, frágil e com debilitações visíveis. Porém, a dedicação, o amor e o cuidado dispensado pelos pais e avós salvaram Lurdinha e hoje ela é conhecida em várias partes do Brasil e do mundo por suas pinturas. Com os pés, a artista fazia qualquer tipo de desenho, principalmente paisagens – seu tema favorito. Na infância, morava em um sítio em Olímpia. Até os cinco anos, se arrastava pela casa, o que obrigou seu pai a comprar proteção para amenizar os machucados. Só depois desta idade é que aprendeu a andar e a exercitar a flexibilidade com os pés. O primeiro incentivo ao desenvolvimento do dom artístico veio do avô Edmundo, que a presenteou com material escolar. Fascinada com os lápis e papéis, desde então não parou mais de surpreender a todos com obras tão belas. A grande transformação em sua vida aconteceu ao completar 18 anos, quando participou do programa Cidade contra Cidade, do apresentador Silvio Santos, na extinta TV Tupi e foi vista na televisão.

APBP Brasil
Arte
A APBP é parte de uma associação internacional de artistas que, devido à sua deficiência física, pintam belas obras de arte com a boca ou os pés.

Contatos:
APBP – Rua Tuim, 426 – Moema – São Paulo/ SP – CEP: 04514-101
(11) 5053-5100
https://apbp.com.br/home

Heroismos

Eu temo muito o mar, o mar enorme,
Solene, enraivecido, turbulento,
Erguido em vagalhões, rugindo ao vento;
O mar sublime, o mar que nunca dorme.
Eu temo o largo mar, rebelde, informe,
De vítimas famélico, sedento,
E creio ouvir em cada seu lamento
Os ruídos dum túmulo disforme.

Contudo, num barquinho transparente,
No ser dorso feroz vou blasonar,
Tufada a vela e nágua quase assente,
E ouvindo muito ao perto o seu bramar,
Eu rindo, sem cuidados, simplesmente,
Escarro, com desdém, no grande mar!

Cesário Verde (Lisboa, Madalena, 25 de Fevereiro de 1855 — Lisboa, Lumiar, 19 de Julho de 1886), In “Poesias Completas de Cesário Verde”. Rio de Janeiro. Ediouro, 1987. Texto-base digitalizado por Emerson Kamiya

Jorge Luis Borges e o “Livro das mil e uma noites”

Desde a infância, o escritor argentino Jorge Luis Borges foi um ávido leitor do “Livro das mil e uma noites”, cuja tradução, realizada por Richard Burton, constava na biblioteca paterna. Essa tradução foi considerada escandalosa por seu teor erótico em plena era vitoriana. Ao longo da vida, Borges também conheceu as traduções de Antoine Galland, de Enno Littmann, de J.C.Mardrus e de Edward W.Lane, as quais estudou e comparou a fim de extrair de cada uma a contribuição do estilo individual, do estilo de época e da cultura de seus tradutores. O autor argentino se inspirou nos contos árabes para escrever alguns de seus contos, como “Os dois reis e os dois labirintos”, no entanto, ele afirma apenas ter feito a tradução de um conto perdido das noites. Apenas muitos anos depois de sua publicação, ele assume a autoria desse conto. Surge, assim, uma nova forma de intertextualidade: a pseudo-tradução. Neste estudo, é feita uma análise dos temas, das estruturas e do estilo próprios dos contos árabes que Borges retomou através de várias formas de intertextualidade, modernizando um gênero literário atemporal: o conto árabe das “Mil e uma noites”.”

Por Thaís de Godoy Morais, In “Livro das mil e uma noites” e suas relações transtextuais com a obra de Jorge Luis Borges – 29 agosto 2017

Jorge Luis Borges (Buenos Aires, 24 de agosto de 1899 — Genebra, Suíça, 14 de junho de 1986)